Reflexões

Minha história: um “chaveiro” no coração

Há algumas semanas, publicamos dois posts que tratam sobre o tema “Chaveiro ou Alpinista?”. O primeiro foi escrito pelo Sandro Lourenço, com o título “Muro ou porta para chaveiros e alpinistas”. O segundo foi um infográfico, comentado pelo Anderson Paz. Ambos os posts foram inspirados no livro “Muro ou Porta?”, de Sérgio Franco, que em breve será relançado, com novo design e mais conteúdo.

As expressões “chaveiro” e “alpinista” são figuras para identificar homens que, em busca de um relacionamento dentro do contexto da igreja, se comportam de maneiras distintas. Pra entender melhor, vale a leitura dos posts já publicados.

Pra fortalecer essa história de chaveiro e alpinista quero abrir meu coração pra falar o porquê, ao meu ver, alguém se comporta como um chaveiro.

Minha teoria é que todo homem, por natureza, é um chaveiro. Nem todo chaveiro é necessariamente um “Dom Juan de Marco”, ou um sedutor barato. O chaveiro, por vezes, é aquele que deseja ter um relacionamento duradouro, mas é alguém que ainda não se arrependeu de fazer as coisas pelas suas próprias forças. É o cara que talvez seria até um bom partido na visão do mundo. Ele sabe o que dizer, tem interesses relevantes, mas não aprendeu a andar no Espírito e é isso que o diferencia do alpinista. E eu preciso admitir que em grande parte da minha história eu fui um chaveiro.

A área sentimental sempre foi um departamento da minha vida em que tive dificuldade de confiar plenamente a Deus. Nas experiências que tive, mesmo no meio da igreja, tentei dar aquela “forcinha” pra Deus. A história do meu relacionamento com a minha esposa infelizmente é cheia de marcas desse tipo. Eu vivia um período em que tinha certeza que não deveria olhar pra ninguém, pois havia pouco tempo que eu tinha finalizado um relacionamento. Eu havia iniciado aquele relacionamento pensando que estava no tempo certo e era com a pessoa certa, mas alguns motivos mostraram que eu havia sido precipitado e movido por muitas ansiedades. E foi nesse período que surgiu a Iza na minha vida, a mulher que veio a se tornar minha esposa, e eu me percebi atraído por ela.

O amigo que me pastoreava de perto percebeu algo em mim e me ajudou a ser profundo o suficiente para assumir que estava atraído. Logo em seguida, uma amiga e irmã em Cristo, mesmo longe e sem conhecer o contexto em que me encontrava, me contou com muita cautela alguns sonhos em que ela recebia o convite do meu casamento, e lá estava o nome da noiva. Adivinha de quem era o nome? Pronto! Estava criado o cenário ideal para que Deus provasse meu coração, se realizaria as coisas na minha própria força ou se eu esperaria as evidências se construírem, mostrando que realmente era Ele quem estava fazendo tudo aquilo. Me agitei e com o tempo passei a me comportar de uma forma bem desprovida de discrição e prudência. Em pouco tempo ela e outras pessoas já haviam percebido o interesse mútuo e a partir daí a história se tornou difícil. Eu queria acertar, mas me comportava como escravo do temperamento ansioso e orgulhoso. Fiz tudo o que um chaveiro faz:

  • Demarquei território: Os animais fazem sempre isso quando querem uma fêmea. rsrs. Demarcam o território. Se certificam de que estão conquistando. No caso humano pode ser um sinal de fraqueza. Insegurança pura! Medo de perder e de que alguém “melhor” se aproxime. Uma demonstração clara de falta de rendição e confiança em Deus. Um “controle” racional e bobo. O projeto se torna nosso e Deus já não tem mais nada a ver com o assunto. Tudo inconsciente e sutil.
  • Mapeei inconscientemente a chave que abria o coração dela: Ela era uma moça ainda frágil em seus sentimentos. Teve relacionamentos antigos em busca de suprir uma carência. O fato de eu ser um “discípulo” de Jesus comprometido com a igreja, com a obra, fez seus olhos “brilharem”
  • Me apropriei no coração: Uma herança só é bendita quando possuída no tempo certo. A posse tem muitos significados, mas aos poucos experimentei uma posse sutil e fora de hora dentro do meu coração. Eu tinha certeza que casaria com ela e já não abria mão dessa ideia. Me tornei obstinado e ainda sim me julgava espiritual e livre.
  • Forcei a barra para plantar admiração: Sabia o que dizer para que ela visse em mim um bom partido. Fiz questão de assumir o papel de um “amigo” que a aconselhava, opinava e sempre tinha na manga o que fazer.

O tempo passou, me disciplinei, alguns equívocos corrigidos e assumimos um compromisso. Porém. com o compromisso já assumido, todos aqueles equívocos acima reapareceram por eu não te-los depositado verdadeiramente na cruz. Por conta disso, alguns sinais começaram a surgir de que estávamos colocando o relacionamento numa posição em nossas vidas que não deveria estar. Nos distraímos muito um com o outro e negligenciamos outras coisas importantes, inclusive o trato como irmãos/amigos que buscam ser parecidos com Jesus. Nos perdemos no sentimentalismo e outras partes foram afetadas a ponto de Deus intervir e falar claramente conosco sobre entregarmos tudo aquilo que construímos da nossa maneira e sacrificarmos aquilo em seu altar.

Tenho certeza que Ele falou com nós dois, mas só ela ouviu. Ela atendeu esse apelo do Espírito e eu continuei duro, tendo uma noção equivocada de  mim mesmo. “Tava tudo tranquilão”, eu dizia. A decisão foi tomada mesmo assim. Ela foi fiel a Deus e eu permaneci nesse orgulho duro sem reconhecer o quanto precisava realmente daquilo. Dizia com minha boca, mas meu coração permanecia o mesmo, sem arrependimento. Mais uma vez o tempo passou, minha obstinação foi quebrada, mas não quebrantada. Sofremos, esperamos e Deus voltou a falar. Era a hora de retomarmos os preparativos pro casório. Eu já mais quebrado, porém hoje reconheço que não alcancei tudo que Ele queria. Como um Pai ele me corrigiu, mas só vim perceber melhor seu ensino e correção depois que passamos por dificuldades no casamento, onde ficaram muito explícitos os “porquês” das coisas. Minha oração tem sido desde então que Ele me faça um homem quebrantado e rendido à Sua vontade, e que eu não perca as oportunidades de renunciar o que for preciso.

Na verdade, toda essa história só mostrou pra mim mesmo o quanto eu não havia renunciado a tudo quanto tenho. Essa é uma demanda de Jesus que, se não atendida, nos impossibilita de sermos seus discípulos. Ele me mostrou com toda essa história a necessidade de me tornar um homem verdadeiramente abnegado. Meu orgulho me fazia ter uma dimensão equivocada de mim mesmo. E eu não percebia o que me faltava. Um chaveiro é alguém que ainda não rendeu tudo verdadeiramente na cruz. E anda em busca de sua própria felicidade com uma máscara de espiritual.

“O homem não pode receber coisa alguma se do céu não lhe for dada” (João 4:27).

Um casamento, uma carreira, conquistas e metas pessoais passam, acabam e só valem a pena se forem dEle, por meio dEle e para Ele. Se não for assim é uma obra morta! Se não realizarmos tudo através dEle, atropelamos o tempo  e o modo das coisas, e a colheita não é boa. Hoje me envergonho de tudo que fiz e pela misericórdia e bondade do Pai temos identificado cada semente ruim que plantamos, procuramos semear novas sementes e buscamos nos arrepender no Senhor. Sei que semeei muito para a carne, mas temos trabalhado pra arrancar essas sementes.

“de Deus não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará” (Gálatas 6:7).

“tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou” (Eclesiastes 3:2).

Não sou frustrado com meu casamento e sou muito feliz ao lado da minha esposa a quem amo muito. Mas não nos iludimos mais. Somos conscientes de que hoje temos muito trabalho a fazer para semearmos para o Espírito e agradarmos o nosso Pai que nos chamou e tem uma obra maravilhosa em nós e através de nós. Ainda que saiba que atrasei muito do que Ele queria realizar em mim.

Os alpinistas e chaveiros de plantão tem toda a chance de não cometer os mesmos erros e não terem os mesmos resultados. Louvo a Deus por que minha história não teve um desfecho ruim por causa da misericórdia e o arrependimento que plantou em nossos corações. Mas não pague para ver o que acontece. Princípio é princípio. E no fim de tudo o que realmente vale a pena é agradar e amar a Deus sobre todas as coisas.

Ideraldo de Assis
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