Mais uma insanidade evangélica: PL 6314/05
Há um projeto de lei (PL 6314/05) tramitando na Câmara dos deputados, de autoria do deputado Hidekazu Takayama, pelo qual líderes religiosos desfrutariam de imunidade quanto aos crimes de difamação e injúria. Ou seja, uma vez aprovado esse projeto, pastores poderão falar o que quiserem no exercício do ministério, sem serem responsabilizados por crime de difamação ou de injúria.
Para quem não sabe, o crime de difamação consiste em atribuir fato ofensivo à reputação de alguém, e o crime de injúria consiste na ofensa à dignidade ou decoro de alguém. Portanto, o PL 6314/05 propõe que líderes religiosos tenham uma licença prévia, um salvo conduto, para ofender e atribuir atos ofensivos às pessoas. E, como uma das coisas mais fáceis neste país é “abrir uma igreja e ser pastor”, a aprovação do PL 6314/05 acabará por formar um “exército” pronto pra atacar os outros com suas palavras, sem que sofram nenhuma punição, alimentando cada vez mais o clima de beligerância presente em nossa sociedade.
Espero que você, caro leitor, me compreenda, mas eu preciso dizer uma coisa: esse projeto de lei é uma insanidade, uma loucura.
É compreensível que um cristão defenda seu direito de dizer que certa conduta não está de acordo com a vontade de Deus, que determinada prática é pecado (pois, pecado não é outra coisa senão a incompatibilidade com a vontade de Deus). Um cristão, enquanto cidadão, pode defender seu direito de dizer para alguém, especialmente que queira abraçar a fé, que determinadas atitudes não são compatíveis com a fé em Jesus, pois o próprio Mestre disse: “Por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que vos mando?” (Lucas 6:46) e “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus” (Mateus 7:21). É legítimo defender o direito de dizer essas coisas, mas sustentar que um pastor possa falar o que quiser sem ser responsabilizado por isso, é um absurdo.
Ainda que o PL 6314/05 seja aprovado, e os líderes religiosos alcancem imunidade quando aos crimes de difamação e injúria, de forma alguma ficarão isentos diante de Deus de obedecer à Palavra:
“Quem, SENHOR, habitará no teu tabernáculo? Quem há de morar no teu santo monte? O que vive com integridade, e pratica a justiça, e, de coração fala a verdade; o que não difama com sua língua, não faz mal ao próximo, nem lança injúria contra seu vizinho… Quem deste modo procede não será jamais abalado” (Salmo 15:1-5)
Será que a bancada evangélica não se lembra do alerta de Tiago sobre os danos que podemos causar com nossas palavras:
“Assim também a língua, pequeno órgão, se gaba de grandes coisas. Vede como uma fagulha põe em brasas tão grande selva! Ora, a língua é fogo; é mundo de iniquidade; a língua está situada entre os membros de nosso corpo, e contamina o corpo inteiro, e não só põe em chamas toda a carreira da existência humana, como também ´posta ela mesma em chamas pelo inferno” (Tiago 3:5-6).
Por isso sempre é bom lembrar dessas advertências:
“Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar. Porque a ira dos homens não produz a justiça de Deus” (Tiago 1:19).
“Porque quem quer amar a vida, e ver os dias bons, refreie a sua língua do mal, e os seus lábios não falem engano. Aparte-se do mal, e faça o bem; Busque a paz, e siga-a” (I Pedro 3:10,11).
Deveríamos sempre estar olhando para Jesus, “o qual, quando o injuriavam, não injuriava, e quando padecia não ameaçava, mas entregava-se àquele que julga justamente” (I Pedro 2:23).
Enfim, quando vejo uma proposta como a do PL 6314/05, só posso acreditar que existe um desvio de foco na vida daqueles que o sustentam. Infelizmente, há gente que pensa que nossa missão é garantir nossa liberdade religiosa. Precisamos lembrar que nossa missão é fazer discípulos de Jesus. Foi para isso que o Mestre nos enviou (Mateus 28:18-2). E, seja com liberdade religiosa, seja com perseguição, continuaremos seguindo nossa missão. Afinal, foi assim que a igreja nasceu, fazendo discípulos debaixo de perseguição, e floresceu com o sangue dos mártires.
Portanto, nossa luta real não é para garantir nossos direitos de expressão. Nossa luta é para anunciar o Evangelho, com ou sem liberdade de expressão, pois sabemos que somos libertos no Senhor.
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