“Assim que me converti, me empurraram para ser uma ponte entre Deus e os homens”
O testemunho de minha conversão com Vahram Tatikian
Eu nasci em um lar evangélico na Palestina, na cidade de Haifa. Hoje, Haifa é o principal porto de Israel, mas quando eu nasci ainda era na Palestina. Quando houve a guerra entre árabes e judeus, nós que não éramos nem palestinos nem judeus, mas armênios, estávamos no meio desse conflito. Meu pai disse: “Nestas terras nunca haverá paz. Melhor irmos para a Argentina, onde tenho uma tia e uma avó”. Assim, viemos para a Argentina no ano de 1948, eu tinha sete anos.
Na Palestina, frequentávamos a igreja dos Irmãos Livres, pois eu nasci em um lar evangélico. Quando viemos para cá, fomos aos Irmãos Livres com a carta de recomendação, na rua Donado. Nos receberam com muito amor, mas como nós só falávamos armênio e não entendíamos o castelhano, decidimos ir à Igreja Armênia da rua Carabobo, e ali congregamos.
Depois de uns dois anos, quando já tínhamos aprendido o idioma, voltamos à Igreja dos Irmãos Livres e nossa rotina era: aos domingos pela manhã ir aos Irmãos Livres, escola dominical, Santa Ceia, e a tarde comparecer à Igreja Armênia para ter comunhão com os armênios.
Em Buenos Aires eu me tornei um menino bastante mau, rebelde, desobediente aos meus pais. Me lancei na rua, e realmente minha conduta era má. Eu lamentava por ter nascido em um lar evangélico, porque meus companheiros de rua podiam pecar livremente, enquanto meus pais me controlavam e não deixavam fazer o que eu queria. Não valorizava a bênção que significa ter nascido num lar evangélico.
No ano de 1957, quando eu tinha 15 anos, houve na Igreja Armênia um avivamento. Veio um pastor chamado Vahram Tatikian, vindo do Líbano, Síria, Turquia. Ele era um solteirão de cerca de 47 anos, um homem com uma enorme paixão pelos perdidos. E ele começou a fazer reuniões todas as noites durante seis meses nas duas congregações armênias que havia. Toda noite pessoas se convertiam.
Tatikian só pregava em armênio e seu sobrinho, José Valian, o traduzia para o espanhol, e isso atraiu muitos jovens que eram filhos de armênios mas não entendiam muito bem o armênio.
Este era um homem muito simples, sua pregação sempre teve 7 pontos, cheia de exemplos e ilustrações. Ele tocava violino, ensinou alguns corinhos muito simples, o que não era uma coisa comum na tradicional Igreja Evangélica Armênia
Eu comecei a ver mudanças em meu pai e em minha mãe a partir de sua participação nessas reuniões. Me diziam: “Jorge, as reuniões são muito boas, por que você não vem conosco?”. E eu respondi: “Ir à reunião num dia de semana? Ainda bem que já vou no domingo!” Eu não queria saber de nada. Mas, como também estava curioso, me chamou atenção algumas coisas que eles contavam, e segunda-feira eu decidi acompanhá-los.
Realmente esse homem me impressionou. Ele pregava, chorava, contava coisas. Suspeitei que meus pais lhe haviam contado da minha vida, porque parecia que tudo o que pregava estava dizendo para mim. Assim que na terça-feira fui outra vez, e na quarta voltei novamente.
Nesse dia, quando terminou a reunião, ele parou na porta para saudar a todos que saíam. Quando chegou a vez dos meus pais, eu estava com eles. Meus pais me apresentaram: “Este é Jorge, nosso filho”. Esse irmão, Tatikian, tomou minha mão e não me soltou, olhos nos meus olhos e me disse: “Me alegro em te conhecer, Jorge, e quero te fazer uma pergunta: você entregou sua vida a Cristo?”. E eu pensei: “o que eu digo? Se eu digo que não, não vai me soltar. Então lhe disse: “Sim, mas estou um pouco frio”. Tinha que suavizar a mentira. Eu sabia que não era um rapaz convertido. Assim, inventei essa resposta para me livrar dele. E ele me respondeu: “Não tem porque você estar frio, vamos orar para que o Senhor te renove”. Então ele parou de cumprimentar as pessoas, me levou para um lado do salão e disse: “Eu vou orar por você, e depois você vai orar”.
Ele orou, não me lembro o que ele disse, mas o que me incomodava é que me havia dito: “agora você ora”. Eu tinha uma tremenda raiva porque ele estava me impondo. Eu queria fugir, mas como eu era envergonhado, me preocupava em dizer “não quero”. Então eu logo comecei a orar. E eu comecei a dizer: “Senhor, tu sabes que eu estou frio…”. Não estava frio, estava morto, mas comecei a planejar uma oração. E na metade da oração, fui tomado de um temor, uma vergonha, porque eu estava acostumado a mentir aos homens, mas querer mentir a Deus me deu temor, vergonha.
E essa sensação foi a tal ponto que na metade da oração, que havia começado com algo inventado, me arrependi, me quebrantei, pedi perdão a Deus por meus pecados.
Então, a metade da oração foi falsa, mas na outra metade me arrependi e me converti. Pedi perdão a Deus não só pelo último pecado que era a mentira, mas também por todos os meus pecados, e o pastor percebeu, e então abriu a Bíblia e leu um versículo que hoje quero ler para vocês, Apocalipse 1:5-6a
“Àquele que nos ama, e, pelo seu sangue, nos libertou dos nossos pecados, e nos constituiu reino, sacerdotes para o seu Deus e Pai”.
Imediatamente, tirou de sua Bíblia o livro sem palavra, e me disse: “Jorge, o teu coração até agora estava assim (e me mostrou a página preta), sujo, escuro por causa do pecado. Mas Cristo te ama e morreu por teus pecados, derramando Seu sangue (me mostrou a página vermelha). E com Seu sangue (abriu a página branca) te lavou dos teus pecados e agora teu coração está limpo, branco como a neve, não ficou nenhuma mancha”. E logo abriu a página dourada e disse: “quando você morrer vai para o céu, com ruas de ouro, ali está a presença do Senhor”.
Isso era usado para as crianças, e eu já era um adolescente, mas caiu bem porque entendi perfeitamente, e a alegria do Senhor e do perdão de pecados encheu meu coração.
Tatikian continuou lendo e me disse: “Agora Ele te lavou e em Apocalipse diz que nos fez reis e sacerdotes. Jorge, agora você é um sacerdote”. Aí eu não entendi nada. Sacerdote, eu? E para piorar as coisas ele falava em armênio e a palavra sacerdote em armênio é Tahaná. Para mim um sacerdote era um homem grande, vestido com uma batina preta como as que naquele tempo usavam os sacerdotes, fossem católicos ou ortodoxos. Eu frequentava a escola armênia que pertencia à Igreja Ortodoxa, ali havia sacerdotes e eram uma eminência. E aquele pastor me dizia que eu era um sacerdote. Não entendi nada.
Tatikian me disse assim: “Agora, quando você for para sua casa no ônibus, dê a cada pessoa um destes folhetos”, e tirou quatro de sua carteira. “Porque o que você recebeu agora, todas as pessoas necessitam”.
Sobre os sacerdotes eu não o entendi, mas o que me disse sobre os folhetos eu compreendi muito bem, mas pensei “nunca vou fazer”, e a frase que me passou pela mente foi: “Espere sentado que eu faça isso”, bem portenho. Assim, por respeito, para não contradizê-lo, coloquei os folhetos no bolso do casaco, e voltei para junto de meus pais.
Subimos no ônibus em Rivadavia e Carabobo, ao 141 que nos levava pra casa, e eu vi que o ônibus estava meio vazio, e me sentei no fundo, nos últimos assentos onde não havia ninguém, porque Tatikian havia me dito que desse os folhetos aos que estavam sentados perto de mim. Então fui fiel à letra. Porém, nas outras paradas subiram mais pessoas, sentaram logo ao meu lado e arruinaram a estratégia. E agora eu começava a ficar incomodado, porque me lembrava da palavra que ele havia me dito: “O que você recebeu, eles também necessitam”.
E os folhetos queimavam no meu bolso, parecia que tinha carvões acendidos. Me sentia mal, olhava pela janela e me sentia realmente mal. Então, para me tranquilizar, tirei os folhetos e disse à pessoa que estava ao meu lado: “Tome, Senhor”. E me perguntou: “o que é”?, “leia” eu lhe disse. Eu não queria saber de falar nada. Assim compartilhei outros três folhetos aos demais e voltei a sentar. Olhava pela janela e orava, mas contra, dizendo: “Senhor, que ninguém me pergunte nada”, e Deus me escutou, porque ninguém me perguntou nada.
Portanto, querido irmão, no primeiro dia, no primeiro instante que me converti, aquele irmão me colocou no ofício de sacerdote. O que é um sacerdote? O papa é chamado de sumo pontífice. Pontífice vem de ponte. E o sacerdote é uma ponte entre Deus e os homens. E agora eu estava funcionando como uma ponte.
Eu, que até o momento não tinha comunhão com Deus, uma vez perdoado dos meus pecados, estava funcionando como uma ponte. Apesar de não entender a palavra sacerdote me empurraram para ser uma ponte entre Deus e os homens.
- Confira também: “Nunca havia me ocorrido que minha responsabilidade como pastor era ensinar a viver”.
Assim nos puseram para trabalhar desde o primeiro dia. Fui superando aquela timidez inicial até que nos acostumamos a repartir folhetos nos bares, nos restaurantes, nos trens, nos bondes, nos hospitais. Lembro-me que uma vez este irmão Tatikian me pediu paro traduzi-lo em uma reunião porque seu sobrinho não podia. Eu tinha 16 anos. “Não sei se vou poder, nunca fiz isso”. “Bom, vamos provar. Eu passo na sua casa e vamos juntos”.
Tomamos o ônibus, ele pegou uns folhetos e me disse: “você distribui naquele lado e eu distribuo por este”. A única coisa que ele sabia dizer em castelhano era “Sírvase, señor”.
“Como não?”, lhe disse, e distribuímos os folhetos. Quando terminamos de distribuir, me disse: “Agora vamos pregar”. “O Quê?!” Isso significava que ele iria pregar em armênio no ônibus e que eu tinha que traduzir para o espanhol. Eu estava desesperado e tentei convencê-lo: “Mas o lugar para onde vamos é perto, a viagem dura 10 minutos”.
“Não importa” – respondeu ele – “pregamos 5 minutos”. Eu esbocei outra desculpa: “Mas já entregamos o folhetos, não interrompamos, deixemos que eles leiam”.
“Não” – disse Tatikian – “se pregarmos eles lerão com mais interesse”. E quanto eu estava buscando um terceiro argumento para freá-lo ele se colocou à frente no ônibus e gritou: “Sirelí paregavner”. Eu tinha que traduzir, ainda que sem vontade: “Queridos amigos, agora estamos viajando, mas há uma viagem mais importante que estamos fazendo, é a viagem para a eternidade.Se você morrer esta noite, para onde vai a tua alma, para o céu ou para o inferno?”. Assim, sem mais.
Assim me formei, comecei e fui empurrado ao ofício sacerdotal. Anos depois entendi o que era um sacerdote, mas entendesse ou não, já estava exercendo nosso sacerdócio.
Jorge Himitian
Extraído e traduzido da página do autor no Facebook
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